segunda-feira 20 2015

PF indicia Marcelo Odebrecht e mais 7 executivos


Delegado também pediu a manutenção da prisão preventiva de cinco executivos, entre eles Marcelo Odebrecht


Marcelo Odebrecht da construtora Odebrecht é encaminhado para o IML de Curitiba (PR), na manhã deste sábado (20)
Marcelo Odebrecht, da construtora Odebrecht(Rodolfo Burher/Reuters)
A Polícia Federal (PF) indiciou nesta segunda-feira Marcelo Odebrecht, presidente da maior empreiteira do país que leva o nome de sua família, e mais sete executivos investigados pela Operação Lava Jato. Eles são suspeitos de praticar os crimes de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, formação de cartel, fraude a licitação e associação criminosa.
Foram indiciados os executivos: Rogério Santos de Araújo, Marcio Farias da Silva, Cesar Ramos Rocha, Celso Araripe de Oliveira, Eduardo de Oliveira Filho, João Antonio Bernardi Filho e Alexandrino Ramos de Alencar - este último afastou-se da empresa.
O delegado Eduardo Mauat também pediu a manutenção da prisão preventiva de cinco desses executivos, entre eles Marcelo Odebrecht e Alexandrino Alencar. A PF usou contra Marcelo Odebrecht um depoimento em que o dono da empreiteira afirma que "continua confiando nos seus companheiros, ou seja, nos executivos que foram detidos, acreditando na presunção de inocência dos mesmos".
"Entendemos, que a partir dessa fala, no cotejo com os demais elementos carreados, Marcelo Odebrecht aderiu de forma inconteste às condutas imputadas aos demais investigados, considerando que delas detinha pleno conhecimento", afirma o delegado. "Além do caso especifico das sondas, o material trazido aos autos aponta para o seu conhecimento e participação direta nas condutas atribuídas aos demais investigados, tendo buscado, segundo se depreende, obstaculizar as investigações."
E-mail - A PF afirma que Marcelo Odebrecht "não apenas tinha pleno conhecimento das irregularidades que envolviam o Grupo Odebrecht, como pretendia adotar uma postura de confronto com a Operação Lava Jato". O delegado analisou o conteúdo do bilhete manuscrito em que o dono da empreiteira determina a "destruição de e-mails", após ter sido preso. A PF contesta o argumento da Odebrecht, segundo quem não faria sentido mandar destruir provas já obtidas pelos investigadores. "Observamos que a destruição de e-mails relativos às sondas poderia ser aplicada à caixa de e-mails do mesmo titular, Roberto Prisco Ramos, cujos arquivos ainda não haviam sido entregues na data em que Marcelo Odebrecht teria dado a ordem aos seus advogados".
Segundo os investigadores, ficou provado que Rogério Araújo realizou transações financeiras em espécie para o Reginaldo Fipli (já morto) e que ele "comandava os depósitos" realizados pelo operador Bernardo Freiburghaus nas contas no exterior dos ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa (Abastecimento) e Nestor Cerveró, ambos já condenados em ações penais da Lava Jato.
Os policiais federais também concluíram que existem elementos que provam o "envolvimento de Alexandrino Alencar em relação ao contrato de nafta da Braskem". A empresa ganhou um aditivo contratual para vender o insumo petroquímico à Petrobras por meio do pagamento de propina a Paulo Roberto Costa e políticos do PP, como o ex-deputado José Janene e o ex-assessor João Cláudio Genú. Segundo Paulo Roberto Costa, a compra, mesmo desvantajosa, foi aprovada mediante o pagamento de propina em contas na Suíça, "na ordem de 3 a 5 milhões de dólares por ano, em média, o que teria ocorrido entre 2006 e 2012".
Vitória - A PF salienta que o grupo se utilizava sobretudo de operações no exterior para o pagamento de propina, de modo a dificultar o rastreamento do dinheiro, mas chama a atenção para irregularidades detectadas em obras da Petrobras em Vitória, no Espírito Santo. Em acordo de delação premiada, o executivo da Camargo Corrêa Eduardo Leite, condenado nesta segunda a quinze anos e dez meses de prisão, detalhou irregularidades nas obras do centro administrativo da Petrobras em Vitória.
Leite afirmou à PF que solicitou ao Diretor de Óleo e Gás da construtora, Paulo Augusto Santos da Silva, uma auditoria a partir das irregularidades apontadas pela Lava Jato. Santos, então, apresentou ao executivo dois contratos firmados entre o consórcio OCCH, composto pelas empresas Odebrecht, Camargo Corrêa e Hochtief, que teriam como finalidade o pagamento de propina a Celso Araripe, gerente local das obras. Um deles, no valor de 1,8 milhão de reais, teve como justificativa serviços de consultoria. "Verifica-se, então, o recebimento de recursos significativos por funcionário da Petrobras e seus familiares, que teriam origem na SulBrasil, empresa contratada pelo consorcio OCCH, pairando também indícios de que nenhum serviço fora prestado pela terceirizada", diz a PF no relatório.

'Dilma não é vítima de coisa alguma'


Historiador analisa o atual cenário político e diz que o brasileiro não se sente representado pelos eleitos. Sobre as chances de Dilma deixar o poder, afirma: 'Há muito mandato e muita acusação pela frente...'


O historiador Boris Fausto
O historiador Boris Fausto: "Dilma está na corda bamba"(Raquel Cunha/Folhapress)
"Lula inventou uma pessoa que evidentemente está aquém da capacidade de governar o país"
Em março de 2004, o historiador Boris Fausto analisou em entrevista a VEJA os desdobramentos do caso Waldomiro Diniz, primeiro de uma escalada de escândalos com que o país lamentavelmente acostumou-se a conviver desde que o Partido dos Trabalhadores chegou à Presidência da República. Na época, porém, os brasileiros não imaginavam que os corredores do Planalto escondiam muito mais do que um assessor corrupto, mas um megaesquema de compra de votos de parlamentares - o mensalão, só seria descoberto um ano mais tarde. Ainda assim, o autor de estudos clássicos como Revolução de 30 e Crime e Cotidiano já alertava para o "risco de desmoralização do partido mais sólido do Brasil" - e para os efeitos disso no campo das ações sociais, bandeira histórica da legenda. Onze anos e dezenas de escândalos depois, Fausto analisa, em conversa com o site de VEJA, os efeitos da crise que parece sem volta na qual o governo Dilma Rousseff mergulhou. Ao analisar como os anos de governo do PT devem entrar para a história, Fausto afirma que os estragos provocados pela corrupção são graves o suficiente para ofuscar os resultados das ações sociais. "O que vai prevalecer no futuro: os inegáveis ganhos sociais ou a imagem de todos os escândalos associados ao PT?", diz. Leia a entrevista ao site de VEJA.
Quão grave é a crise que o governo atravessa hoje? Há semelhanças entre essa e as que culminaram nas quedas de Jango e Collor? São situações bem diferentes. O que elas têm em comum é a gravidade. As duas primeiras, de formas diversas, acabaram resultando na queda dos presidentes. Ainda não temos elementos suficientes para saber como esta vai terminar. Mas o fato de a presidente Dilma Rousseff ter concedido uma entrevista na qual diz que não vai cair revela uma situação em que ela e o Executivo estão, para usar uma linguagem do boxe, contra as cordas.
Diante das críticas, a presidente recorre com frequência a analogias sobre o período em que foi torturada pelo regime militar. O que isso representa para a imagem dela? Em relação àquela época, pode-se até discordar da forma de luta armada contra o regime, mas essa é uma circunstância absorvida pelo tempo. O que prevalece é que ela e milhares de brasileiros tiveram uma atitude corajosa de enfrentar dessa ou daquela maneira a ditadura. Mas a utilização desse passado como tentativa de valorizar ou reforçar a imagem da presidente hoje é um problema. Isso porque a situação é completamente outra. Dilma não é, atualmente, vítima de coisa alguma. Quando torturada nos porões da ditadura, sim. Hoje ela apenas é responsabilizada por comportamentos e decisões, para dizer o mínimo e ser bem leniente, muito discutíveis. É outra situação. E isso é uma demonstração de fraqueza muito grande - inclusive, o reconhecimento da gravidade da situação em que ela se encontra. Um presidente que vem a público pra afirmar "eu não vou cair" é porque está na corda bamba.
Há de fato chance de Dilma não terminar o mandato? Falta tanto tempo e a crise é tão grave que chance há. Essa história do impeachment vai depender de muitas coisas. É uma espécie de onda que vai e vem. Essa onda é muito rápida: com frequência parece que chegamos a um paroxismo, que não vai haver saída, e depois há certo arrefecimento. Mas há muito mandato e há muita acusação por ai...
Nesse cenário, qual o papel da oposição? O próprio PSDB não se entende sobre essa questão...O PSDB se modificou muito internamente, não do ponto de vista de quem o apoia, já que ele sempre foi um partido de classe média. O que acontece é que o partido tinha uma posição razoavelmente clara em outra época, em outro período. Tinha figuras politicas representativas, como Mário Covas, Franco Montoro, e figuras relativamente mais novas, como Fernando Henrique Cardozo. Mas a falta de homogeneidade interna se acentuou ao longo dos anos. O partido não soube ficar na oposição e, agora, quando teria todas as condições de captar o descontentamento popular, é um partido que as pessoas vêm com muitas restrições. Não é possível ser entusiasta do PSDB.
Falta coerência ao partido? Claro. Tome-se a votação que derrubou o fator previdenciário como um exemplo de oportunismo. Entre ser coerente com o que fez no passado ou atacar o PT, preferiu-se a segunda opção. Quando você prefere uma circunstância oportunista de ataque, é muito desmoralizante.
Aécio Neves teve mais de 50 milhões de votos no ano passado e saiu do pleito como nome forte para liderar a oposição. Ele conseguiu fazê-lo ou o país ainda carece dessa liderança? Não o fez e não sei se vai conseguir. As pessoas têm limites. Não é uma questão de culpa, é uma questão de aptidão. Eu o acho melhor que os outros, inclusive votei nele, mas sua capacidade de liderar é limitada por uma série de fatores, pessoais inclusive. Não tem uma postura de quem está se forjando como líder, vai entusiasmar e ditar rumos. Isso é difícil, depende de muito talento.
Ao término de sua mesa na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), o senhor foi bastante aplaudido quando criticou tanto governo quanto oposição. O brasileiro está descrente da classe política? Sim. Existe sim uma descrença em relação aos políticos e instituições: o Congresso Nacional em primeiro lugar, mas hoje também o Executivo. O Congresso esgotou, pelo menos nessa conjuntura, a capacidade de representação da cidadania. Já o Executivo entrou em crise com uma série enorme de acusações, como nunca se viu na história deste país. Salva-se o Judiciário, que tem avançado. Salvam-se órgãos como o Ministério Público e a Polícia Federal. Mas isso tudo se dá num clima de muita desesperança porque, no fundo, os órgãos especificamente políticos entraram em crise.
Embora essa crise atinja também o Congresso, é ele quem tem ditado a agenda política nacional. Nosso Parlamento evoluiu ao longo dos anos? O Congresso ganhou uma relevância, nesse momento, que não tinha quando o Executivo estava forte. Quando a presidente ou o presidente, no caso do Lula, era forte, o Congresso tinha uma posição de quase subordinação em relação ao Executivo. Isso acabou por força do desprestigio, da fraqueza do Executivo. Mas não acredito que do ponto de vista da legitimidade, dos senadores e deputados realmente representarem a cidadania, as coisas tenham mudado muito. Já me chamaram em certa ocasião de saudosista quando eu disse o que vou dizer, mas não é uma questão de saudosismo, trata-se de uma constatação. O Parlamento no período democrático que começou em 1945 e findou com o golpe de 1964 era muito mais representativo, tinha muito mais qualidade. Os partidos tinham mais significado ideológico, tinham mais significação, enfim, tudo considerado, aquele parlamento era melhor do que esse.
O senhor se lembra em algum momento na história de algum presidente da Câmara como Eduardo Cunha? Não. Eduardo Cunha é sui generis. Ele conhece bem o regimento, brinca com ele, faz manobras heterodoxas. Ele está aparecendo com destaque nesse momento, mas o percurso político que vai seguir é difícil de prever. É bom lembrar que ele está sendo investigado no Supremo Tribunal Federal, o que não é confortável...
O Brasil vive hoje uma onda conservadora? Claramente. Em terrenos como a questão do aborto, do casamento gay e da separação de Igreja e Estado, que vem sendo arranhada com muita frequência, o retrocesso é evidente. Não que o país já não fosse conservador, mas isso está se acentuando. Esse quadro tem muito a ver com o avanço das denominações religiosas evangélicas e da criação de uma bancada evangélica bastante forte, além da característica geral do Congresso que foi eleito em 2014.
O ambiente político hoje permitiria ao país enfrentar um processo de impeachment sem risco à consolidação da democracia? Nesse momento, a não ser que decisões do TCU e do TSE agravem muito mais a situação e o Congresso se mova a reprovar contas, eu não creio, apesar de toda essa gravidade, que estejamos caminhando para um impeachment. Mas esse é um processo previsto em lei. Se houver fundamento, ele terá legitimidade. É, contudo, uma operação traumática, difícil. Será um momento delicado, como é delicada a atual situação. É difícil saber como o país se comportaria. Se a situação se arrastar ao longo do próximo ano e, eventualmente, houver impeachment, quem ganha com isso é o Lula.
De que maneira? Se isso acontecer - e estou falando como hipótese -, haverá protestos e o PT se utilizará do discurso, como já vem fazendo, de que houve golpe e a presidente foi vítima de uma conspiração da direita. Mas com o passar do tempo, o cenário ficará mais favorável ao Lula. Seria possível separar com mais facilidade as figuras dele e de Dilma, sobretudo pelo reforço da ideia de que os tempos do ex-presidente eram outros, sem crise na economia, por exemplo. Hoje Lula está numa posição difícil, e se fossem convocadas eleições neste ano é muito duvidoso que ele conseguisse reverter a situação negativa, o "volume morto", em que se encontra. A hipótese mais provável em caso deimpeachment, contudo, é a de que o vice-presidente Michel Temer assuma o Planalto até 2018. Dessa forma, o quadro pode pender para uma virada em que o Lula volte a aparecer como figura muito forte. A longo prazo, a constatação de que Dilma sucumbiu aos próprios erros podem descolar sua imagem da de Lula. A queda da criatura ajuda o criador. Mas é preciso dar tempo ao tempo.
Como esses mais de dez anos de governo do PT serão lembrados? A imagem das gerações futuras é dada pela transmissão de conhecimento. Portanto, precisamos nos perguntar se o que vai prevalecer são os inegáveis ganhos sociais ou a imagem de todos os escândalos, como nunca houve na história deste país, associados ao PT. Não se deve negar os ganhos no terreno social, mas é preciso dizer que os males causados pelo partido nas instituições, na decência administrativa, são de tal ordem que indicam uma apreciação negativa desses anos no futuro.
E Dilma, a primeira mulher na Presidência da República, como entrará para a história? Sou muito a favor do ingresso das mulheres na politica, mas a essa altura isso não tem muita importância. O que prevalece é que o Lula inventou uma pessoa que evidentemente está aquém da capacidade de governar o país.