domingo 08 2015

A boa vida dos operadores do petrolão

Lava Jato

Operação Lava Jato revelou que ex-funcionários da Petrobras desfrutavam de apartamentos luxuosos, casas de veraneio milionárias e até uma aeronave com capacidade para nove pessoas. Tudo com dinheiro desviado do assalto à Petrobras

Daniel Haidar
Beechcraft Super King Air 200
Fortuna: Ex-gerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco comprou avião Beechcraft Super King Air 200 por R$ 1,4 milhão (Divulgação)
As cifras do maior escândalo de corrupção já descoberto no Brasil ainda causam perplexidade aos investigadores da força-tarefa montada pelo Ministério Público e pela Polícia Federal. O patrimônio – não declarado -- dos superfuncionários que operavam a sangria nos cofres da Petrobras permitiu uma vida cercada de luxo, comparável à de pessoas afortunadas no Brasil. Mas um trio de ex-diretores da estatal acabou fisgado pela mais bem sucedida operação da Polícia Federal da história, batizada de Lava Jato. E a riqueza da elite de dirigentes da Petrobras revelou-se ainda mais grandiosa: estimativas preliminares  apontam que o pagamento de propina em troca de contratos na petrolífera rendeu mais de 40 milhões de reais a cada um dos ex-diretores na mira da Justiça. E esse dinheiro acabou convertido em apartamentos milionários, casas de veraneio de luxo e em uma aeronave com capacidade de até nove pessoas.
Desde que a Lava Jato ganhou contornos jamais vistos nos relatos de assalto aos cofres públicos do país, um personagem chama a atenção: Pedro Barusco, ex-gerente de Serviços da petroleira, subordinado a Renato Duque, este indicado ao cargo pelo ex-ministro mensaleiro José Dirceu. Barusco, um personagem inicialmente considerado secundário no propinoduto, admitiu ter enviado para o exterior 97 milhões de dólares, que aceitou devolver aos cofres públicos como exigência de um acordo de delação premiada – a colaboração com as investigações lhe renderá uma punição mais branda. Antes disso, Paulo Roberto Costa, outro importante ex-dirigente da empresa, que ficou preso por seis meses, também fez um acordo e teve de devolver quase 27 milhões de dólares escondidos no exterior, embora os investigadores até hoje cogitem que ele omitiu das autoridades a posse de mais recursos. 
Morador de uma mansão em São Conrado, na Zona Sul do Rio, Barusco abusou a tal ponto da roubalheira que participou da compra de um avião por 1,4 milhão de reais. Os gastos foram divididos com o operador Mário Góes, que, segundo as investigações, pagava propina para fechar contratos da Petrobras a mando de grandes empreiteiras, como UTC, MPE, OAS, Mendes Júnior, Andrade Gutierrez, Schahin, Carioca Engenharia e Bueno Engenharia. Registrada em nome da empresa de Góes, a aeronave Beech Aircraft, modelo 200, foi sequestrada pela Justiça para ressarcir os cofres públicos.

Barusco revelou às autoridades que escondia parte da propina de Renato Duque, o homem do PT no propinoduto da Petrobras. Mas mesmo o patrimônio oficial do ex-diretor de Serviços mostra uma vida luxuosa. Ex-morador de um apartamento na Tijuca, na Zona Norte do Rio de Janeiro, Duque chegou a ser preso no dia 14 de novembro com executivos e sócios de empreiteiras do chamado Clube do Bilhão. Conseguiu o direito de responder ao processo em liberdade. Continua a desfrutar de uma cobertura, adquirida por 1,2 milhão de reais, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste, do Rio.

Duque utilizava sua consultoria, a D3TM, na qual os filhos também eram sócios, para registrar parte dos imóveis que desfrutava. Só de empreiteiras acusadas de participar do esquema de corrupção a consultoria de Duque faturou 4,8 milhões de reais em 2013: 4,3 milhões de UTC, 300.000 da OAS e 130.000 reais da Iesa Óleo e Gás. O lobista Milton Pascowitch, operador da Engevix, também pagou 600.000 reais para o ex-diretor. Para os investigadores, os pagamentos foram recompensas por facilidades garantidas na Petrobras. Esse dinheiro não ficou parado. A empresa registrou a compra de quatro imóveis por 1,5 milhão de reais nos últimos dois anos. Como revelou VEJA, foram compradas duas salas comerciais, no Centro do Rio, de uma empresa chamada Hayley, que os investigadores suspeitam que pertencia ao lobista Fernando Soares, o Baiano – ou o operador do PMDB na roubalheira. Há suspeita de que a transferência de Baiano para Duque, concretizada em novembro de 2013, tenha sido uma operação de lavagem de dinheiro. O ex-diretor já estava instalado no local desde janeiro daquele ano. Pela empresa, Duque também adquiriu dois apartamento em Ubatuba, no litoral paulista, por 720.000 reais.

O ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró não ficou atrás em cifras. Comprou nove imóveis em nove anos na capital fluminense e em Petrópolis, na região Serrana. As transações foram registradas em cartórios por 1,7 milhões de reais. Mas uma negociata revelada por VEJA mostra que ele também tentou esconder das autoridades um duplex de 300 metros quadrados com piscina. Ele é suspeito de ter montado uma offshore para comprar o apartamento, hoje avaliado em 7,5 milhões de reais, em Ipanema, na Zona Sul do Rio. Morou no imóvel por cinco anos. A operação é investigada pela Polícia Federal. Para driblar a Receita Federal, Cerveró declarava pagamentos de alugueis mensais para a offshore, como se não fosse ele o verdadeiro dono do apartamento.

Como revelou o site de VEJA, a família do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa também montou um pequeno império imobiliário na Barra da Tijuca, bairro nobre da Zona Oeste do Rio. De 2009 a 2013, o ex-diretor, a esposa Marici, as filhas Arianna e Shanni e os genros Humberto Mesquita e Márcio Lewkowicz compraram 13 imóveis na capital fluminense. Por uma empresa de consultoria utilizada para receber propina, Costa ainda adquiriu uma casa de veraneio em Mangaratiba, na Costa Verde fluminense, por 3,2 milhões de reais, e uma lancha Intermarine 42 pés por 999.618,25 reais. A casa de praia e a lancha tiveram de ser devolvidos com a fortuna escondida no exterior, como exigência do acordo de delação premiada.

Se for descoberto que Costa e Barusco esconderam bens das autoridades, os dois perdem os benefícios do acordo de delação e provavelmente passarão décadas na cadeia. Porém, as revelações feitas em depoimentos permanecem válidas. Mas, como a Lava Jato ainda rastreia o caminho percorrido pela propina para os beneficiados do maior esquema de corrupção da história contemporânea do país, não é exagero afirmar que essa turma não foi a única a enriquecer e desfrutar de uma boa vida custeada pelo dinheiro roubado da Petrobras
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Impeachment?

Veja.Com

A palavra que assombra o PT começará a ser ventilada com mais frequência por aí. É inevitável que o debate vá para este lado. A convergência de vetores aponta nessa direção. O ex-presidente Collor caiu por conta de uma Fiat Elba, na verdade o “batom na cueca”. Sabe-se que os motivos eram mais profundos e tinham ligação com a fragmentação da base aliada no Congresso e a péssima situação econômica.
Pois bem: nossa economia já está em crise, que vai se agravar nos próximos meses. A inflação deve rodar acima de 7% ao ano, o que ultrapassa o teto permitido pela elevada meta. A indústria só faz sangrar e começa a demitir mais gente. A atividade deve se contrair em 2015. Sim, a temida palavra, que Dilma descarta mas que se mostra cada vez mais provável: recessão!
Se a economia vai jogar mais lenha na fogueira, a política não fica atrás. A derrota humilhante do governo na eleição para presidente da Câmara mostra como será difícil para Dilma impor sua agenda ou evitar a da oposição. Eduardo Cunha é seu desafeto, e com fama de fisiológico. Alguns interpretam que isso significa apenas um preço mais alto para fechar acordos e garantir a “governabilidade”. Mas outros acreditam que o buraco é mais embaixo.
No mais, a articulação política de Dilma é péssima. O historiador Marco Antonio Villa, em artigopublicado hoje no GLOBO, desce a lenha nos poderosos ministros escolhidos por Dilma, principalmente Mercadante. E constata que seu novo governo acabou antes mesmo de começar. Diz ele:
Isolada no Palácio do Planalto, a presidente perdeu a capacidade de iniciativa política. E pior: se cercou de auxiliares ruins, beirando o pusilânime. Nenhum governo sério pode ter na coordenação política Aloizio Mercadante. Na primeira presidência Dilma, ele ocupou três ministérios distintos e não deixou sequer uma simples marca administrativa. Foi um gestor de soma zero. Lula, espertamente, nunca o designou para nenhuma função executiva. Conhece profundamente as limitações do ex-senador e sabe o potencial desagregador do petista. Não satisfeita com a ruinosa escolha, Dilma nomeou para a coordenação política o inexpressivo e desconhecido Pepe Vargas. Não é a primeira vez que a presidente mete os pés pelas mãos ao formar sua equipe política. É inesquecível a dupla Gleisi Hoffmann e Ideli Salvatti, mas naquele momento a conjuntura política e o cenário econômico eram distintos.
Além da situação econômica cada vez pior, o que gera pressão popular por mudanças e perda de apoio de aliados tradicionais (só interessados nas boquinhas estatais), e da fragilidade da base aliada no Congresso, com um presidente independente (na verdade, hostil ao governo), resta sondar o aspecto jurídico. Um impeachment é uma decisão sempre política, mas precisa ter base legal para sustentá-lo.
Eis onde entra o parecer técnico dado pelo respeitado jurista Ives Gandra Martins. Em artigopublicado hoje na Folha, o advogado explica em pormenores seu parecer, mostrando que há, de fato, argumentos jurídicos para se falar em impeachment. Diz ele:
Ao interpretar o conjunto dos dispositivos citados, entendo que a culpa é hipótese de improbidade administrativa, a que se refere o artigo 85, inciso 5º, da Lei Suprema dedicado ao impeachment.
[...]
À luz desse raciocínio, exclusivamente jurídico, terminei o parecer afirmando haver, independentemente das apurações dos desvios que estão sendo realizadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público (hipótese de dolo), fundamentação jurídica para o pedido de impeachment (hipótese de culpa).
Não deixei, todavia, de esclarecer que o julgamento do impeachment pelo Congresso é mais político que jurídico, lembrando o caso do presidente Fernando Collor, que afastado da Presidência pelo Congresso, foi absolvido pela suprema corte. Enviei meu parecer, com autorização do contratante, a dois eminentes professores, que o apoiaram (Modesto Carvalhosa, da USP, e Adilson Dallari, da PUC-SP) em suas conclusões.
Ou seja, um time de peso já atesta que não é absurdo algum falar em impeachment do ponto de vista jurídico. A tendência é que o tema ganhe mais destaque nos próximos meses, quando o escândalo da Petrobras for mais conhecido nos seus detalhes, quando os efeitos dos “ajustes fiscais” surgirem com mais vigor, e quando o Congresso deixar ainda mais claro que não segue mais as ordens do Planalto.
Villa conclui que não faltará “agito” este ano, mas cobra uma postura diferente da oposição, que deveria ter aprendido com seus grandes erros de 2005:
Teremos um 2015 agitado, o que é muito bom. Nunca um governo na História da República esteve tão maculado pela corrupção, nunca. O que o Brasil quer saber é se a oposição estará à altura da sua tarefa histórica. Se não cometerá os mesmo erros de 2005, no auge da crise do mensalão, quando não soube ler a conjuntura e abriu caminho para a consolidação do que o ministro Celso de Mello, em um dos votos no julgamento do mensalão, chamou de “projeto criminoso de poder.”
Rodrigo Constantino

Datafolha: 44% dos brasileiros acham o governo de Dilma ruim ou péssimo

Pesquisa

Pela primeira vez, avaliação negativa do governo da presidente supera a positiva. Somente 23% da população considera seu desempenho bom ou ótimo

A presidente Dilma Rousseff discursa durante cerimônia de posse de seu segundo mandato, em Brasília - 01/01/2015
Dilma Rousseff: para 77% dos brasileiros, ela sabia da corrupção na Petrobras (Ed Ferreira/Estadão Conteúdo)
A popularidade de Dilma Rousseff atingiu a pior avaliação desde que ela assumiu a presidência da república, em 2011. Para 44% dos brasileiros, desempenho da presidente é ruim ou péssimo. Essa é a primeira vez em que a avaliação negativa do governo supera a positiva. Somente 23% da população considera seu desempenho bom ou ótimo. Os dados foram revelados pela pesquisa Datafolha divulgada neste sábado pelo jornal Folha de S. Paulo e realizada de 3 a 5 de fevereiro.
Trata-se de uma inversão diante da última pesquisa realizada pelo instituto, há dois meses. Em dezembro, 42% avaliaram o governo de Dilma ótimo ou bom, e 24%, ruim ou péssimo.

Capitaneada pelo escândalo do petrolão, a corrupção é apontada como o segundo maior problema do país por 21% dos entrevistados, atrás somente da saúde (26%). Para 77% das pessoas ouvidas pelo Datafolha, Dilma sabia do petrolão. Desses entrevistados, 52% disseram que a presidente foi conivente com o escândalo e 25%, que ela não poderia fazer nada para evitá-lo. Apenas 14% acreditam que Dilma desconhecia a corrupção na estatal.
Infográfico/VEJA
Para 44% dos brasileiros, governo da presidente é ruim ou péssimo













Petrolão — A pesquisa é mais uma notícia ruim neste início de segundo mandato da presidente. Desde que chegou ao Palácio do Planalto, Dilma vive sua pior semana.
Na quinta-feira, em um acordo de delação premiada, o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco afirmou à Justiça que o tesoureiro petista, João Vaccari Neto, recebeu até 200 milhões de dólares em propina desviados de contratos da Petrobras. Com planilhas, tabelas e percentuais de propina previamente definidos, Barusco jogou luz às atividades criminosas do arrecadador do PT, colocando em xeque a lisura das próprias contas de campanha da presidente. Vaccari é o substituto do mensaleiro Delúbio Soares e passa agora à condição de personagem central da crise que assola o PT.

No centro da crise está a Petrobras, empresa usada para alavancar a imagem tanto de Dilma quanto de Lula e que agora, sabe-se, também usada para desviar dinheiro para políticos e partidos governistas. Nesta semana, a presidente da estatal, Graça Foster, e mais cinco diretores deixaram o cargo. O nome do substituto só foi anunciado na sexta-feira: na contramão da lista de preferidos do mercado, que defendia a escolha de um nome não político, Dilma optou por Aldemir Bendine, presidente do Banco do Brasil e escudeiro do PT. A tarefa de Bendine será blindar a Petrobras durante as investigações da Polícia Federal.

O propinoduto na Petrobras também teve desdobramentos desfavoráveis para o governo no Congresso. A oposição protocolou um novo pedido de CPI para investigar a estatal, que teve o apoio do novo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), eleito à revelia do Palácio do Planalto. Cunha chega ao posto com uma ampla base de apoio, tão diversa que abriga sem constrangimento diversos aliados do governo. Fortalecido, o peemedebista emparedou o Planalto logo no primeiro dia em que sentou à Mesa: em pouquíssimas horas de sessão, fez avançar um projeto de reforma política que o PT não quer. Ele é contrário – e promete ir até o fim – para desidratar a proposta de financiamento público de campanhas políticas, uma das principais armadilhas petistas para a perpetuação no poder.