domingo 18 2015

Quer se apaixonar (e ser correspondido)? A ciência ensina como

Relacionamentos


Rita Loiola
Casal de mãos dadas
Além do papel de perpetuar a espécie, apaixonar-se tem um enorme significado em todas as culturas. É a fonte de nossas piores e melhores emoções (Thinkstock/VEJA)
Solteira e cansada de procurar namorado pela internet, a americana Mandy Len Catron decidiu usar a ciência para encontrar o amor. Na metade do ano passado, a escritora e professora da Universidade British Columbia, no Canadá, chamou um conhecido para, juntos, reproduzirem um experimento do psicólogo Arthur Aron que fez com que dois estranhos se apaixonassem em laboratório. Em 1997, Aron demonstrou que bastava responder 36 questões pessoais, cada vez mais reveladoras e, em seguida, olhar profundamente nos olhos um do outro durante quatro minutos para que a paixão surgisse. A experiência deu tão certo que, na última semana, Mandy, de 33 anos, decidiu contar sua história com final feliz em uma coluna do jornal The New York Times e instigar outras pessoas a fazer o mesmo.
Nas últimas duas décadas, as pesquisas científicas não só revelaram os mecanismos do nascimento da paixão, como ensinaram a buscar e manter a felicidade dos casais. A ciência do amor desvendou atitudes e exercícios que incentivam a cumplicidade, a confiança e o interesse mútuo e tiveram a eficácia comprovada por estudos de psicólogos, neurologistas, antropólogos e neurocientistas de diversas partes do globo.
“Além do papel de perpetuar a espécie, apaixonar-se tem um enorme significado cultural. É a fonte de nossas piores e melhores emoções”, afirma a psicóloga Debra Mashek, professora da Faculdade Harvey Mudd, no Canadá, e autora de uma série de livros sobre a psicologia do amor. Desde os anos 2000, Debra desenvolve pesquisas para compreender a complexidade das conexões entre os seres humanos. “O amor é uma motivação poderosa para pessoas de todas as culturas e eras. É sempre emocionante ver o resultado de nossos estudos serem usados para unir os seres humanos.”
Paixão em minutos — Arthur Aron foi um dos primeiros a colocar o amor, emoção aparentemente irracional, sob as lentes da ciência. O psicólogo, que trabalha na Universidade Stony Brook, em Nova York, queria saber se era possível fazer com que estranhos formassem vínculos fortes em minutos. Com sua série de perguntas, em menos de uma hora, os participantes afirmaram que se sentiram muito próximos de suas duplas. Quando a experiência foi feita com pessoas de sexo diferente, alguns se apaixonaram e chegaram a se casar.
“É importante notar que a intimidade significa se sentir compreendido, validado e cuidado. Assim, quando alguém se arrisca a mostrar quem realmente é, apresenta-se sem julgamentos, faz pergunta importantes, agradece ao outro pela confiança e o deixa fazer o mesmo, temos o primeiro passo para a proximidade e a paixão”, explica Debra, que trabalhou com Aron em seu laboratório.
A fórmula do amor — Essa intimidade, no entanto, não era o que, de início, os pesquisadores acreditavam que seria o gatilho do amor. O primeiro manual científico sobre o tema trazia uma receita bem mais simples para despertar a paixão: “A admiração. O prazer. A esperança”. A tríade descrita em Do Amor, ensaio escrito em 1822 pelo francês Stendhal – pseudônimo do diplomata Marie-Henri Beyle (1783-1842) –  definiu, durante muito tempo, a compreensão daquilo que os cientistas descrevem como "apaixonamento", ou seja, os primeiros passos do amor.
Foi a partir dos anos 1970 que o tema começou a ser estudado em laboratórios de universidades. Além da experiência de Aron, o pesquisador John Gottman, então na Universidade de Washington, instalou seu “Laboratório do Amor” para fazer diversos estudos com casais e conseguiu prever, com certa precisão, se recém-casados se divorciariam depois de alguns anos. Na época, os pesquisadores buscavam entender como funcionam as engrenagens do amor e, para isso, o primeiro foco foram os comportamentos e atitudes que poderiam levar alguém a encontrar seu par.
No entanto, os estímulos e as reações variam entre as pessoas, culturas ou faixas etárias e os cientistas precisavam de elementos que pudessem ser medidos de forma indistinta entre os seres humanos. Assim, no início dos anos 2000, a ciência se voltou para o cérebro dos apaixonados, submetendo-os a ressonâncias magnéticas e buscando localizar áreas mentais, hormônios e neurotransmissores que funcionam da mesma forma em todas as pessoas.  
“Se o amor realmente tem uma lógica, é preciso que haja substâncias cerebrais que o expliquem. Hoje sabemos que o hormônio oxitocina, em conjunto com a dopamina e norepinefrina, são os responsáveis pelas reações químicas que constituem o amor”, diz a psicóloga Andrea Lorena Stravogiannis, pesquisadora do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso da Universidade de São Paulo (USP).
Atualmente, a ciência estuda a interação entre os parâmetros comportamentais e as substâncias cerebrais que explicam o que acontece no corpo e na mente dos apaixonados. Afinal, comportamentos disparam reações químicas que ajudam a criar ou fortalecer vínculos. Confira aquilo que, segundo a ciência, é capaz de fazer alguém se apaixonar:

O experimento de Arthur Aron

Em 1997, o pesquisador americano Arthur Aron liderou um estudo publicado no periódico 'Personality and Social Psychology Bulletin', apresentando um método para criar intimidade em 45 minutos. Trata-se de 36 perguntas pessoais, divididas em três seções, em grau crescente de intimidade. Seu objetivo era descobrir se dois estranhos poderiam se tornar próximos ao compartilhar informações particulares. Essa abertura lenta e recíproca seria, de acordo com os autores do estudo, um padrão-chave para o desenvolvimento de relações íntimas. Após perguntarem e responderem as questões, os participantes deveriam se olhar nos olhos por até quatro minutos. De acordo com Aron, quando a experiência foi feita com pessoas de sexo oposto, alguns pares se apaixonaram – e chegaram a se casar.

Parte 1

1. Se pudesse escolher qualquer pessoa no mundo, quem você convidaria para jantar?
2. Gostaria de ser famoso? Como?
3. Antes de fazer uma ligação, você ensaia o que vai dizer? Por quê?
4. O que seria um dia perfeito para você?
5. Quando foi a última vez que você cantou para si? E para outra pessoa?
6. Se você pudesse viver até os 90 anos com ou a mente ou o corpo de alguém de 30 anos, qual das duas opções você escolheria?
7. Você tem uma intuição secreta sobre como morrerá?
8. Fale três coisas que você e seu parceiro têm em comum
9. Pelo que em sua vida você sente mais gratidão?
10. Se pudesse mudar alguma coisa no modo como foi criado, o que seria?
11. Use quatro minutos para contar a seu parceiro sua história de vida com o máximo de detalhes possíveis
12. Se você pudesse acordar amanhã e ganhar qualquer qualidade ou habilidade, qual seria ela?

Parte 2

13. Se uma bola de cristal pudesse contar a verdade sobre você, sobre sua vida, sobre o futuro ou sobre qualquer outra coisa, o que você gostaria de saber?
14. Há algo que você sonha em fazer há muito tempo? Por que ainda não fez?
15. Qual é a maior realização de sua vida?
16. O que você mais valoriza em uma amizade?
17. Qual é a sua memória mais querida?
18. Qual é a sua memória mais terrível?
19. Se você soubesse que vai morrer de repente, em um ano, você mudaria algo no modo como vive hoje? Por quê?
20. O que a amizade significa para você?
21. Qual o papel que amor e afeto têm em sua vida?
22. Em turnos, divida algo que você considera uma característica positiva de seu parceiro. Compartilhem um total de cinco itens.
23. O quão próxima e carinhosa é sua família? Sente que sua infância foi mais feliz que a de outras pessoas?
24. Como você se sente sobre sua relação com sua mãe?

Parte 3

25. Faça três frases afirmações verdadeiras sobre “nós”. Por exemplo: “Nós dois estamos nessa sala sentindo...”
26. Complete a frase: “Eu desejaria ter alguém com quem eu pudesse dividir...”
27. Se você se tornasse um amigo próximo de seu parceiro, por favor compartilhe o que seria importante que ele ou ela saiba.
28. Diga a seu parceiro o que você gosta nele; seja bem honesto dessa vez, dizendo coisas que você não diria a alguém que acabou de conhecer.
29. Divida com seu parceiro um momento embaraçoso de sua vida
30. Quando foi a última vez que chorou na frente de alguém? E sozinho?
31. Diga a seu parceiro algo que você já gosta nele.
32. O que, de todas as opções possíveis, é muito sério para que se faça piada?
33. Se você fosse morrer esta noite sem ter a oportunidade de se comunicar, o que você mais se arrependeria de não ter falado a alguém? Por que você ainda não disse?
34. Sua casa, que contém tudo o que possui, pega fogo. Depois de salvar quem você ama e seus animais de estimação, você pode salvar um último item. O que seria? Por quê?
35. De todas as pessoas em sua família, que morte você consideraria mais perturbadora? Por quê?
36. Divida um problema pessoal e peça um conselho a seu parceiro de como você deveria agir. Também peça a seu parceiro que lhe conte como você parece estar se sentido sobre o problema que compartilhou.

O olhar fixo

Após a série de perguntas, os pares deveriam se olhar fixamente nos olhos por dois até quatro minutos. De acordo com a americana Mandy Len Catron, que refez a experiência com um conhecido no meio do ano passado, encarar alguém por dois minutos é aterrorizante, mas assim que essa fase passa, é possível chegar a lugares absolutamente inesperados.

Incentive o outro a crescer

Tenha uma postura de conquistador

Estar com o corpo de frente para o parceiro, sem braços cruzados, a uma distância não muito grande e com o foco da atenção no outro é o modo mais claro de demonstrar interesse. “A linguagem não-verbal conta muitos pontos na conquista. É essencial estar próximo fisicamente, orientado para o outro e sem obstáculos materiais entre eles. Essas são formas não apenas de demonstrar interesse, mas também de senti-lo”, explica Amélio.
A capacidade de estimular o outro e encorajá-lo a superar seus limites, conceito conhecido como ‘expansão do eu’, aparece em um artigo de 1986 do psicólogo americano Arthur Aron. De acordo com o estudo, essa é uma postura altamente sedutora. “Uma presença que, constantemente, incentiva seu parceiro a crescer, a enfrentar os medos e a ter coragem de fazer o que realmente gosta é muito atraente. Não há nada melhor que descobrir coisas novas junto com alguém”, explica o psicólogo Ailton Amélio, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) e o maior pesquisador da área no Brasil.

Mantenha conversas leves

O início da conversa deve ser leve, de forma que o assunto não seja mais revelante que a pessoa que está em sua frente. “Mais importante que estar bem informado ou exibir um passado interessante, é saber aproveitar informações que o outro oferece gratuitamente como ganchos para o bate-papo. Se ao comentar sobre o tempo o parceiro diz que na cidade onde nasceu faz muito calor, ela está oferecendo uma bela informação pessoal que dá abertura para saber mais sobre sua vida e engatilhar uma conversa”, explica Amélio. Além disso, é importante não desprezar as opiniões ou sinais que o parceiro está dando. Assim que o relacionamento for evoluindo, conversas mais profundas e íntimas ajudarão a fortalecer os vínculos. 

Sorria e olhe nos olhos

Alguns estudos demonstram que as pessoas são mais atraentes quando exibem um sorriso no rosto. Eles são melhores que uma expressão neutra ou irritada e dão abertura para que a sedução aconteça. “Sorrir e olhar nos olhos são atitudes afetuosas que estimulam a produção do hormônio oxitocina, o chamado ‘hormônio do amor’”, diz a psicóloga Andrea Lorena Stravogiannis, pesquisadora do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso da Universidade de São Paulo (USP). 

Toque

De acordo com o psicólogo Ailton Amélio, o toque sutil, quando permitido pelo outro, costuma ser o ‘clique’ que falta para que a paixão aconteça. “Ele precisa ser carinhoso, começar delicadamente nas mãos ou antebraço e se tornar mais demorado ao longo da conversa. Se, ao sentir o toque, o outro sorrir, já é meio caminho andado para a conquista. Na nossa cultura, o toque é permitido durante a conversa, então devemos aproveitar essa abertura, quando o parceiro consentir”, diz Amélio.

Seja um bom ouvinte

A capacidade de saber ouvir é essencial para demonstrar o interesse e levar um casal a desenvolver uma relação próxima. Isso significa, além de olhar para quem fala, prestar atenção ao que diz e sinalizar que está interessado, com palavras ou sinais de concordância ou discordância ou fazendo perguntas sobre o assunto. Quem ouve o outro de maneira impassível demonstra, sutilmente, que não se interessa pela vida de quem fala.

Admire seu parceiro

Esse ingrediente é fundamental para as primeiras etapas do amor. É importante admirar e valorizar características e atitudes do parceiro. “É difícil saber o que faz de uma pessoa alguém admirável. Há as características óbvias como ser belo, rico ou famoso, mas normalmente a admiração é despertada pelo carisma ou pela capacidade de deixar o outro à vontade”, explica Amélio.

Mostre que está disponível

Uma dose de insegurança é importante para a paixão, mas é preciso que o parceiro saiba que está sendo correspondido ou tenha a esperança de que um relacionamento possa ser estabelecido. “Os dois precisam estar disponíveis para que a paixão aconteça. O sinal claro de que não há a possibilidade de que uma relação surja normalmente é um balde de água fria na paixão”, explica Amélio.

Vá além da amizade

Cumplicidade, confiança ou capacidade de sentir-se à vontade com o outro constituem não só o amor, mas também a amizade entre duas pessoas. O limite entre a amizade e o amor está no interesse romântico entre o casal. “É preciso sinalizar que está interessado no outro de forma romântica para que a relação não se torne uma grande amizade”, diz a psicóloga Andrea Lorena Stravogiannis. “Por meio da conversa ou da linguagem não-verbal é importante sinalizar que deseja mais que uma amizade com o outro.”

Seja afetuoso

Carinho e afeto são comportamentos importantes envolvidos com a liberação de oxitocina, hormônio que faz com que os casais criem vínculos, evoluam para o sentimento de amor romântico e permaneçam juntos. Por isso, é importante ter atitudes carinhosas e demonstrar o afeto em palavras e gestos. "A oxitocina motiva a relação e o afeto motiva sua produção. É uma via dupla que ajuda a construir as relações românticas, explica Andrea.

Picasso and Dance. Parade, 1917